~~O beijo~~

~~O beijo~~
Naquela noite, eu tive momentos de lucidez e consciência, outros não tão conscientes assim... Talvez tudo não tivesse passado de um sonho...
É, eu achava que não...
Mas o que sei é que ao longo de minha estadia no hospital com aquele são bernardo guardando meu sono e me protegendo até mesmo do que não precisava, minha recuperação foi bem rápida.
Quer dizer, "rápida"...
Era o que eu ouvia dos médicos...
Eram apenas palavras meio soltas até os últimos dias, quando eles de fato me deixavam ficar consciente o suficiente para entender tudo o que havia acontecido...
O tiroteio havia sido bastante longo... Longo o suficiente para que os vizinhos do bar chamassem a polícia a tempo de capturar os atiradores...
Quando a polícia chegou viu uma cena digna de quadros de revolução...
A quantidade de corpos no chão era enorme, uma vez que o bar estava lotado, e ninguém escapara sem pelo menos um tiro... O barman e algumas outras pessoas estavam mortas... E eu quase me unira à esse montante não fosse pelo fato de que ele havia permanecido segurando o corte na minha jugular com o braço bom.
Ele, meu são bernardo protetor... Meu cão de guarda, meu fiel companheiro.
Eu devia minha vida à ele e eu não sabia como pagar essa dívida...
Não tinha idéia...
...
Acordei de meus devaneios com o bater leve na porta do banheiro do meu quarto no hospital. Já estava vestida, e o rasgão em meu pescoço já havia diminuído bastante, me possibilitando mexer um pouco o braço. Bem pouco por enquanto, mas o suficiente para que eu me vestisse...

"Você precisa de ajuda...?"

A voz grossa veio do outro lado da porta e eu o reconheci de imediato. Olhei uma última vez naquele espelho e notei que estava consideravelmente pronta, faltava apenas fechar o zíper do vestido em minhas costas, uma vez que estava vestindo um vestido justamente para mover o mínimo possível o braço do lado da jugular que havia sido ferido.

"Preciso sim. Pode entrar."

Não, eu não havia trancado a porta, mas sabia que não seria necessário. Ele não deixaria ninguém entrar, e ele com certeza já havia me visto em situações piores, bem piores, uma vez que eu imagino que apagada e sangrando quase até a morte não deveria ter sido muito sexy.
Ele entrou e me observou, seus olhos passaram por meu corpo todo, mas diferentemente do que aconteceria se outra pessoa me olhasse daquela forma, aquilo não me incomodou. Sem dizer uma palavra aproximou-se e fechou o zíper de meu vestido com cuidado, evitando até mesmo chegar muito próximo de meu braço.

"Você sabe que poderia encostar em mim se quisesse, certo...? O braço está ótimo. É o pescoço que está meia-boca."

Ele me lançou um olhar severo por alguns instante, antes de acariciar meu braço levemente.

"Sei disso. Mas as chances de você se mexer demais sem a minha ajuda e tirar esse curativo do lugar já são bem grandes para que eu a ajude..."

Lhe dei um rosnado baixo, que só serviu para ele dar um riso orgulhoso e exibido, o que acabou arrancando de mim um sorriso... Afinal, ele estava certo, não?
Como sempre.

"Ah é? E que pretende fazer? Se mudar para minha casa e ficar me seguindo com algumas gazes e faixas?"
"Não. Você vai para a minha."

Ele respondeu antes que eu pudesse terminar meu riso, me fazendo engasgar um pouco no riso e corar imensamente.
Ele estava falando sério?

"Não posso.. Quer dizer... Eu tenho a minha casa... E... E meu trabalho!"

Pensar no meu chefe que nunca aparecera durante toda a minah estadia no hospital me enrolou o estômago.

"Não importa. Não vou te deixar e não suporto seu marido. E nem o homem que te levou até o bar daquela vez..."
"O taxista?"

Eu tentei fugir da pergunta, rir... Mas ele sabia bem o que me levava a beber. Ele sempre soube. E bastou um olhar severo para que eu soprasse a franja do rosto e me voltasse de frente para ele, agora de costas para o espelho.

"Era meu chefe... O dono da empresa..."

Eu ignorei a olhada feia de seus olhos negros diretamente nos meus.

"Não me olhe desse jeito... Não me tirou nada que eu já não tivesse perdido..."
"Te fez levar um tiro."
"Eu teria levado o tiro de qualquer jeito. Ele me deixou em casa. Meu marido que havia trancado a porta."
"Ele de novo."

Ele rosnou para mim e me pegou pelo braço bom, levou os lábios até os meus e me beijos.
De uma forma que eu nunca havia sido beijada antes...

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